O que se entende por divisão social do trabalho

Entende-se por divisão social do trabalho às atribuições (individuais ou colectivas) produtivas nas estruturas socioeconómicas. Nessa perspectiva, cada sujeito possui uma função na estrutura social, da qual emana seu status perante a sociedade.

A divisão social do trabalho vem ser a especialização de funções entre os indivíduos de uma sociedade. Quanto mais for especializada sua actividade, mais o membro de uma sociedade passa a depender dos outros membros.

Em suma, a divisão social do trabalho está relacionada à maneira pela qual as tarefas são organizadas e divididas no ambiente de trabalho, com a intenção de delimitar as funções realizadas, dinamizar o processo de produção como um todo e, consequentemente, garantir que o sistema de produção funcione de forma rápida e eficiente. Ela define a maneira pela qual os indivíduos, dentro de uma sociedade, se organizam com a finalidade de produzir um objecto, produto ou mercadoria.

Surgimento da divisão social do trabalho

Numa fase inicial das sociedades humanas, a divisão social do trabalho era definida por critérios sexuais e de faixa etária. Desta divisão, derivam outras, como a divisão sexual do trabalho, a divisão capitalista do trabalho, a divisão internacional do trabalho. Entretanto, o incremento da agricultura levou divisões sociais no trabalho ainda mais significativas. Isso aprofundou aqueles critérios sexuais e também diferenciou o trabalhador agrícola daquele dedicado exclusivamente à criação de animais dando a génese da propriedade privada.

Como as actividades agrícolas e pastoris impedem que estes trabalhadores se dediquem a produção dos instrumentos necessários a sua sobrevivência, surgem os artesãos. Estes, trocam seus produtos manufacturados por géneros alimentícios. E, destas trocas, surge outra divisão social do trabalho, a saber, a actividade mercantil. O desenvolvimento do comércio aprofundou a distinção entre os trabalhadores rurais e urbanos, onde se destacavam os sectores comerciais, administrativos e artesanais. Por fim, sob a égide do Capitalismo, a especialização produtiva ganha uma complexidade cada vez maior, até atingir os parâmetros da divisão internacional de trabalho. Nela, o trabalhador é um especialista e uma pequena parte do processo produtivo.

Causas do aumento da divisão social do trabalho

Os seres humanos trabalham para satisfazer suas necessidades, desde as mais simples, como as de alimento, vestimenta e abrigo, até as mais complexas, como as de lazer, crença e fantasia. Sinteticamente, as causas do aumento da divisão social do trabalho são as seguintes:

  • Um aumento do volume da população;
  • Uma maior aproximação dos membros da sociedade no espaço físico;
  • Uma maior comunicação e interdependência dos indivíduos no espaço social.

O papel da divisão social do trabalho

Para Martins (2006), a divisão social do trabalho desempenha o seguinte papel:

  • Aumenta simultaneamente a força produtiva e habilidade do trabalhador;
  • É a condição necessária do desenvolvimento intelectual e material das sociedades;
  • É a fonte da civilização;
  • Função de criar entre duas ou várias pessoas um sentimento de solidariedade;
  • Estabelece uma ordem social e moral sui generis: indivíduos que, sem isso, seriam independentes, estão ligados uns aos outros/ conjugam seus esforços/ são solidários.

Teóricos da divisão social do trabalho

Divisão social do trabalho para Durkheim

O sociólogo francês Émile Durkheim, em sua obra intitulada “A Divisão Social do Trabalho”, procurou compreender as repercussões da divisão do trabalho e do aumento do individualismo na integração social.

Os princípios da divisão do trabalho são mais morais do que económicos. São os factores que unem os indivíduos numa sociedade, pois geram um sentimento de solidariedade entre aqueles que realizam as mesmas funções. Outro factor importante é que este pensador analisava a sociedade como uma metáfora do corpo humano. Nessa ideia, a divisão social do trabalho seria responsável por manter a harmonia deste sistema de órgãos que compõe o organismo. Para ele, é o crescimento populacional o responsável pela divisão do trabalho.

Além disso, Émile afirmou que quanto maior e mais complexa for uma sociedade, maior será a divisão social do trabalho presente na mesma. Daí o efeito mais importante da divisão do trabalho não é o seu aspecto económico (aumento de produtividade) mas a integração e a união entre os membros.

Para Durkheim se não houver solidariedade numa sociedade não tem como ela existir e funcionar harmonicamente, as condições impostas pela sociedade moderna pode até trazer respaldos positivos, a exemplo da própria solidariedade por meio da dependência de serviços, evitando a anomia. Assim como outros fenómenos, a divisão do trabalho é um fenómeno social.

Para Durkheim, há duas formas de solidariedade: mecânica e orgânica.

a) Solidariedade Mecânica – é a da fase primitiva, ainda não havia tanta divisão social do trabalho, sociedade simples, e todas as pessoas realizavam as tarefas necessárias, logo, a dependência de um indivíduo com relação ao outro é menor. Os indivíduos compõem as mesmas representações colectivas, as mesmas finalidades, comungando dos mesmos valores. O trabalho necessário, para atender suas necessidades, encontra-se diferenciado apenas entre os sexos. Mas, ao longo do tempo essa solidariedade se transforma.

A solidariedade mecânica é uma divisão do trabalho pouco desenvolvida. Não havia um grande número de especializações. As pessoas dependiam do trabalho das outras. Todos tinham a mesma religião, as mesmas tradições, os mesmos sentimentos, os mesmos valores. A consciência colectiva era forte e pesava sobre o comportamento de todos. Predominava o Direito Repressivo (Penal) pois o crime feria os sentimentos colectivos. O que une as pessoas não é o fato de um depender do trabalho da outra, mas a aceitação de um conjunto de crenças, tradições e costumes comuns

b) Solidariedade Orgânica – com a divisão social do trabalho temos o que Durkheim conceituou de solidariedade orgânica, seu aparecimento deve-se a diversificação da sociedade e os laços de dependência nesta seria de quanto maior a divisão do trabalho maior também seria a dependência. Isso é uma característica de uma sociedade moderna, cuja divisão social do trabalho é bastante definida, assim, a solidariedade orgânica implica maior autonomia, e a consciência individual mais livre.

Há divisão de trabalho porque há mais especializações de funções. O que une as pessoas é a interdependência das funções sociais. A consciência colectiva é fraca pois é difusa, difundindo-se pelas diversas instituições. Predomina o Direito Restitutivo (Civil), pois há função do Direito mais do que punir o criminoso, é restabelecer a ordem que foi violada. O que une as pessoas é a necessidade que umas têm das outras, em virtude da divisão social do trabalho.

Portanto, no pensamento de Durkheim, por sua vez, fica evidente que no processo de divisão do trabalho preponderam os valorais morais em detrimento dos económicos. Ainda de acordo com o pensador, são esses valores que possibilitariam o surgimento da solidariedade entre aqueles que desempenham as mesmas tarefas. Por entender a sociedade através da metáfora de um corpo, Durkheim afirma que a divisão do trabalho mantém a harmonia do sistema.

Divisão Social do Trabalho para Karl Marx

Para Marx, a divisão do trabalho só efectivou-se no momento da separação entre trabalho manual e trabalho intelectual. A divisão entre os tipos de trabalho aconteceu a partir da segmentação do trabalho na indústria e nas sociedades capitalistas. No trabalho intelectual, os trabalhadores técnico-científicos são os responsáveis pela organização do sistema de produção e pela submissão dos operários ao sistema de produção capitalista. A divisão entre proletários e donos dos meios de produção é base para as explicações sobre desigualdade social.

Os operários, por sua vez, dedicam-se ao trabalho manual, numa relação de troca desigual com o dono da propriedade e com os trabalhadores técnico-científicos. A condição de trabalho dos proletários faz com que eles percam a noção completa do trabalho que realizam e passam a viver momentos de alienação.

Enquanto Durkheim percebia na divisão social do trabalho, principalmente na sociedade moderna, uma forma de evitar a anomia (o caos) e, portanto, haver certa solidariedade entre os homens, Marx fez uma leitura inversa., enxergando a divisão social do trabalho como um meio pelo qual se dava a relação de exploração, antagonismos e contradições, cujas relações sociais estão pautadas em interesses diversos.

Para Karl Marx (1818-1883), a divisão do trabalho em especialidades produtivas gera uma hierarquia social na qual as classes dominantes (burguesia) subjugam as classes dominadas, ao estabelecer as instituições legitimadoras e ao deter os meios de produção. Essa dominação é tensa e gera um conflito chamado de “luta de classes”. Ademais, para ele, a especialização das actividades produtivas nas sociedades complexas gerou uma divisão do trabalho social como uma forma vital de sobrevivência. E assim, ao superar as suas necessidades básicas, a humanidade cria outras.

Marx e Engels lançam severas críticas a divisão social do trabalho de Durkheim, avançando que ela é uma forma de desigualdade social, que decorre da separação entre o trabalho manual e intelectual.

Existem contradições numa estrutura classista, o antagonismo de interesses que caracteriza necessariamente uma relação entre classes, devido ao carácter dialéctico da realidade. Dado que as classes dominantes sustentam-se na exploração do trabalho daqueles que não são proprietários nem possuidores dos meios de produção, assim como em diversas formas de opressão social, política, intelectual, religiosa, entre outras.

Assim, a divisão social do trabalho, para Karl Marx (1987, p. 36), seguirá esses compassos e descompassos, e para legitimar o seu poder nesta relação de dominação as classes dominantes se utilizam do aparato do Estado, através das instituições que são criadas e estabelecidas para legitimar essa força por vezes coercitiva.

Marx (1987), não via na crescente divisão social do trabalho uma fonte de solidariedade entre os homens, como acreditava Durkheim. Marx compreendia que era justamente a solidariedade entre os homens, em sua relação de trabalho, que a exploração, o antagonismo e a alienação, traços marcantes na relação proletários e burguesia, eram reforçados. Visto que os trabalhadores não dominando os meios de produção, teriam apenas a sua força de trabalho, e dessa forma estavam submetidos a uma dominação económica, cultural e política, uma vez que o Estado se apresenta enquanto um meio, com seus aparelhos repressivos, tais como a polícia o exército, entre outros meios pelos quais a burguesia impõe seus interesses particulares.

Divisão Social do Trabalho para Max Weber

Max Weber analisa a divisao social do trabalho a partir da ótica religiosa, estabelecendo divisões e diferenças entre o trabalho dos católicos e protestantes. Na obra weberiana, a divisão do trabalho é determinada a partir das crenças religiosas que diferem protestantes e católicos. No escrito “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo”, Weber faz uma detalhada análise, relacionando os protestantes ao sucesso nos trabalhos que desenvolvem na sociedade capitalista.

Na percepção desta nítida diferença da divisão social do trabalho entre Católicos e Protestantes, Weber avança que os protestantes eram austeros e valorizavam o trabalho, além de possuírem uma doutrina religiosa mais alinhada ao Capitalismo. Isso culminou na tendência ao empreendedorismo, típica nas sociedades protestantes.

Outro factor primordial em Weber é sua visão da Burocracia enquanto modo racional da divisão do trabalho. Nela, os cargos ocupados por um burocrata com funções e atribuições específicas, são subordinadas a outro cargo mais elevado, onde se dá a distinção social no trabalho. Além disso, a burocracia notoriamente auxilia a classe dominante ao estabelecer a divisão do trabalho entre dominantes e dominados.

Referências Bibliográficas

CHARON, Joel M. Sociologia. 5ª Ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2002.

COSTA, Maria Cristina Castilho. Sociologia: Introdução a Ciência da Sociedade. São Paulo, Editora Moderna, 1987.

DURKHEIM, Émile, O Suicídio. Lisboa, Presença, 2007.

FERREIRA, Carvalho. Sociologia. Lisboa: McGRAW-HILL, 1995.

MARTINS, Carlos Benedito. O que é sociologia. São Paulo, Brasiliense, 2006.

MARX Karl & ENGELS Friedrich. Manifesto do Partido Comunista. Progresso, 1987.

MARX, Karl. Manuscritos econômicos e filosóficos e outros textos escolhidos. São Paulo : Abril Cultural, 1978.

MARX, Karl. O capital, crítica da economia política. São Paulo: Civilização Brasileira, 2006

MARTINS, Eduardo Simóes. “Os Papéis Sociais na Formação do Cenário Social e da Identidade.” Kinesis, Vol. II, nº 04, Dezembro de 2010, pp. 40-52.

MENDRAS, Henri. O que é a Sociologia . São Paulo: Manole, 2004.

SILVA, Graciette Borges da. “Critérios de Estratificação Social.” Revista de Saúde Pública de São Paulo, 1881: 38-45.

THOMPSON E. P. Miséria da Teoria: ou um planetário de erros. 2009.

VIERA, Edgar CARVALHO & Ivo. Sociologia: Papel Social e Estatuto Social. Santarém: ESGS, 2008.

WEBER, Max, Economia e Sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva. Brasília, Universidade de Brasília, 2009.