Por que nao tem vacina para dengue

A farmacêutica Takeda solicitou à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) o registro de uma nova vacina contra a dengue. A TAK-003 é feita com uma versão modificada do vírus vivo atenuado e protege contra os quatro sorotipos da doença.

No estudo de fase 3, a vacina demonstrou eficácia geral de 80,2% na prevenção de casos confirmados de dengue. A proteção foi ainda maior contra hospitalizações (90%) e dengue hemorrágica, a versão mais grave da doença (85%).

O trabalho segue em andamento, acompanhando cerca de 20 mil crianças e adolescentes recrutados entre 2016 e 2017. Os achados mais recentes, publicados no periódico The Lancet, são dos primeiros 18 meses pós-vacinação. A investigação continua para conferir outros dados, como a duração da imunidade e segurança em longo prazo.

No registro submetido à avaliação da Anvisa, a fabricante indica que a fórmula poderá ser inoculada em pessoas entre 4 e 60 anos que tiveram ou não dengue. Esse é um detalhe importante. Vamos a ele.

A vacina que temos hoje tem uso limitado

Existe uma vacina contra a dengue aprovada no Brasil, a Dengvaxia, da Sanofi-Pasteur. Mas ela só está disponível na rede particular, e para quem já teve a doença. Ou seja, é preciso fazer um teste sorológico para verificar a presença de anticorpos (já quem nem sempre a infecção provoca sintomas) ou ter recebido a confirmação no passado.

Isso porque, em indivíduos sem contato prévio com o vírus, o imunizante pode provocar um quadro chamado de antibody-dependent-enhancement (ADE), algo como “amplificação da doença causada por anticorpos”, em tradução livre. “Nessa situação, há o risco de desenvolver quadros mais graves de dengue ao ser infectado depois de receber a dose”, conta o pediatra José Geraldo Leite Ribeiro, vice-presidente da Regional de Minas Gerais da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm-MG).

Por causa dessa restrição, o imunizante da Sanofi-Pasteur acabou não deslanchando e ficou restrita a um número pequeno de pessoas.

Já a Takeda afirma que a TAK-003 não desperta tal mecanismo. “Os 20 mil voluntários da fase 3 foram testados antes de começar a pesquisa e, entre eles, 27,6% eram soronegativos (não tinham anticorpos contra o vírus)”, comenta Abner Lobão, diretor executivo de Medical Affairs da Takeda no Brasil.

Com três anos de acompanhamento, os pesquisadores não detectaram nenhuma ocorrência do tipo. No caso da Dengvaxia, foram cerca de cinco anos até flagrar a relação. “O desafio da Anvisa será interpretar se o período desse estudo é o suficiente para demonstrar que não há o risco”, comenta Leite.

Continua após a publicidade

A Takeda informou à Anvisa que a vacina pode ser tomada por todos. “Estamos tranquilos em afirmar que ela não causa o problema”, completa Lobão.

Como ela funciona

A TAK-003 é uma vacina quimérica de vírus vivo atenuado. Traduzindo: é feita com pedacinhos de vírus modificados para ficarem mais fraquinhos, incapazes de provocar sintomas importantes. Diferentemente da Dengvaxia, que usa uma versão do agente por trás da febre amarela, o produto tem como base o sorotipo 2 do próprio causador da dengue. “Por meio da engenharia genética, ele passa a conter em sua superfície partes dos outros sorotipos, 1, 3 e 4”, conta Lobão.

A vacina deve ser tomada em duas doses, com três meses de intervalo, e ainda não se sabe se precisará ser reaplicada de tempos em tempos. “Os dados atuais indicam que a imunidade se mantém, mas precisamos acompanhar os voluntários por mais tempo”, completa o porta-voz da fabricante.

Quando deve chegar

A Anvisa tem 60 dias para decidir sobre o registro. O plano é que, uma vez aprovada, ela seja negociada com o governo e incorporada ao Programa Nacional de Imunizações (PNI).

Se realmente a vacina da Takeda puder ser aplicada na população como um todo, independentemente de uma infecção prévia por dengue, o potencial benefício para a sociedade é grande. Apesar de pouco falada no momento, a dengue segue fazendo estragos durante a pandemia de Covid-19. “Os casos dessa infecção na América Latina dobram a cada dez anos, o que mostra que nossas medidas de controle de vetores não estão funcionando”, pontua o pediatra da SBIm.

Em 2020, foram registrados quase um milhão de casos prováveis de dengue no Brasil, segundo o Ministério da Saúde, dado que pode estar subestimado pela onipresença do coronavírus na rede de atendimento.

Existe ainda uma vacina sendo produzida pelo Instituto Butantan. Ela é de dose única, também tem ação contra os quatro sorotipos e foi testada em 17 mil voluntários na fase 3, mas os resultados da fase final ainda não foram divulgados.

O Brasil é um país que anualmente sofre com o aumento exagerado dos casos de dengue, uma doença viral transmitida pelo mosquito Aedes aegypti. Até pouco tempo atrás, essa doença possuía como forma de prevenção apenas o controle do mosquito, entretanto, atualmente, existe uma vacina registrada na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

→ Características gerais da dengue

A dengue pode ocorrer de modo assintomático ou de forma grave, podendo até mesmo levar à morte. Entre os sintomas e sinais mais comuns dessa doença, podemos citar a febre alta de início repentino, dores pelo corpo, fraqueza, dor atrás dos olhos e manchas na pele. A forma grave normalmente causa dores abdominais intensas, sangramentos, acúmulos de líquidos no corpo, vômitos persistentes, aumento do fígado e irritabilidade.

Como não existem medicamentos específicos para a dengue, o tratamento medicamentoso é feito apenas para diminuir a dor de cabeça e no corpo. Além dos remédios recomendados para esse fim, é fundamental repouso e o consumo de muitos líquidos.

→ A primeira vacina contra a dengue

Apesar de em várias partes do Brasil existirem relatos de distribuição de vacinas contra a dengue há muitos anos, a primeira vacina só recebeu registro da Anvisa em dezembro de 2015. Inicialmente, a vacina foi comprada apenas por redes de hospitais e clínicas particulares, e os preços de cada vacina deveriam ficar em torno de R$132,76 a R$ 138,53. Vale destacar que as clínicas podem cobrar pela aplicação do produto, o que faz com os preços da vacina variem de um estabelecimento para outro.

A primeira vacina comercializada chama-se Dengvaxia e é produzida pelo laboratório francês Sanofi Pasteur. Esse produto previne contra os quatro sorotipos existentes da dengue e é fabricado a partir de um vírus atenuado, ou seja, mais fraco e incapaz de desencadear a doença.

A Dengvaxia deve ser administrada em pacientes de 9 a 45 anos. O esquema de vacinação consiste em três injeções que devem ser aplicadas em intervalos de seis meses. Todas as três doses devem ser tomadas para garantir a eficácia do produto.

É importante destacar que a vacina não confere proteção 100% à dengue. Em média, duas em cada três pessoas ficam realmente imunizadas com a vacina. Assim sendo, é fundamental que as medidas de proteção contra o mosquito continuem sendo realizadas, evitando, por exemplo, a proliferação do Aedes por causa de água parada.

A vacina pode ser tomada por pessoas que tiveram dengue ou não, mas não deve ser tomada por pacientes que estão com sintomas da doença. Grávidas não devem tomar a vacina, assim como pessoas que apresentam alergia a algum princípio ativo. A doação de sangue fica temporariamente proibida, pois a vacina apresenta vírus atenuados. A recomendação é que a doação seja feita apenas após quatro semanas de vacinação.

Assim como qualquer medicamento ou vacina, a Dengvaxia também pode causar efeitos colaterais. Todavia, é importante destacar que não ocorre com todas as pessoas. Entre os efeitos mais comuns, podemos citar febre, dor de cabeça, dor, inchaço, vermelhidão e hematoma no local de aplicação e mal-estar.

Curiosidade: O Instituto Butantan também está criando uma vacina contra a dengue, entretanto, ela ainda passa por testes para confirmar sua eficácia.

Por Ma. Vanessa dos Santos

Por que nao tem vacina para dengue

Fig 1. Ilustração 3D representando vírus da dengue. As cores indicam diferentes proteínas do vírus. Crédito: Dr_Microbe/iStock

Estudos e pesquisas para desenvolvimento de uma vacina contra a dengue eficaz estão avançados

Covid-19, poliomielite, sarampo e cerca de outras 30 doenças podem ser prevenidas por vacinas oferecidas gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), por meio do Programa Nacional de Imunização (PNI). Por causa das vacinas, milhões de vidas foram salvas e algumas doenças se tornaram raras. No entanto, quem olhar a lista dos imunizantes disponíveis no PNI não vai encontrar nenhuma vacina contra a dengue… Pelo menos, por enquanto.

Infelizmente, a dengue é uma antiga conhecida dos brasileiros. A primeira epidemia comprovada no nosso país aconteceu no começo da década de 1980, mas há evidências de que a doença chegou aqui pela primeira vez ainda no século XIX. E a chegada em terras brasileiras do mosquito transmissor, o Aedes aegypti, aconteceu muito antes.

Como o nome ‘aegypti’ já indica, o mosquito é originário do Egito e provavelmente chegou ao Brasil nos navios que traziam pessoas escravizadas da África. Além do Brasil, o Aedes aegypti vem se espalhando pelas regiões tropicais do mundo desde o século 18.

Mapa da dengue no mundo

Hoje, a dengue alcança mais de cem países. Cerca de metade da população mundial vive em áreas afetadas e, a cada ano, 50 milhões de pessoas desenvolvem a doença. Observe o mapa, você consegue localizar o Brasil?

Por que nao tem vacina para dengue

Fig 2. Mapa-múndi mostrando os países com casos de dengue em cinza escuro. Quanto maior o tamanho dos círculos em vermelho, maior o número de casos naquele país. Dados de 2020. Crédito: European Centre for Disease Prevention and Control. Para dados mais recentes, consulte: https://www.ecdc.europa.eu/en/dengue-monthly

No Brasil, os casos acontecem em todas as regiões do país. Só em 2019, foram mais de 1,5 milhão de novos casos e 754 mortes por aqui. No país, o Aedes aegypti transmite a febre chikungunya e a Zika, além da dengue. Ele também tem capacidade de transmitir o vírus da febre amarela, na chamada forma urbana da doença.

Por que nao tem vacina para dengue

Fig 3. No Brasil o Aedes aegypti transmite a febre chikungunya e a Zika, além da dengue. Ele também tem capacidade de transmitir o vírus da febre amarela, na chamada forma urbana da doença.  Crédito: CarlaNichiata / iStock

Uma vacina “quatro em um”

A dengue pode ser causada por quatro subtipos do vírus, chamados DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV-4. Atualmente, todos circulam no Brasil. Na prática, isso significa que uma pessoa pode pegar dengue até quatro vezes na vida, caso seja contaminada pelos quatro subtipos, um de cada vez. Porém, a partir da segunda infecção, aumentam as chances de a doença evoluir para a forma grave, popularmente chamada de dengue hemorrágica.

Não existem nenhum remédio eficaz contra o vírus da dengue em si. E, para ser eficiente, a vacina precisa “treinar” nosso sistema imunitário a reconhecer e combater os quatro subtipos virais. Há vários anos, pesquisadores de diversos países, incluindo do Brasil, se dedicam a criar uma vacina contra a dengue usando diferentes tecnologias.

Afinal, existe vacina contra a dengue?

No momento, apenas uma vacina contra a dengue está em uso: é a CYD-TDV, mais conhecida como Dengvaxia, fabricada pela empresa farmacêutica Sanofi Pasteur. Ela foi lançada em 2015 e aprovada em alguns países, incluindo o Brasil. Essa vacina é feita com tecnologia de DNA recombinante: usando a estrutura do vírus atenuado da febre amarela, os pesquisadores “trocam” certos genes, inserindo “partes” dos quatro subtipos de vírus da dengue. Assim, a pessoa que recebe a vacina passa a produzir anticorpos contra os vírus da dengue. É necessário tomar três doses.

Porém, a Dengvaxia está licenciada no Brasil apenas em certos casos e para pessoas entre 9 e 45 anos que já tiveram dengue – ou seja, ela não deve ser tomada por quem nunca teve a doença. Além disso, essa vacina não é igualmente eficiente para os quatro subtipos de vírus da dengue, e os critérios para utilização podem variar dependendo do país. Por exemplo, nos Estados Unidos, somente crianças e adolescentes de 9 a 16 anos, que já tiveram dengue e que vivem em regiões onde há muitos casos da doença, possuem indicação para a Dengvaxia.

A Dengvaxia não faz parte do Programa Nacional de Imunizações, o PNI, isto é, não está no calendário nacional de imunizações. Algumas prefeituras compraram doses dessa vacina e a aplicam em casos específicos. Além disso, ela também pode ser encontrada em serviços privados de vacinação, mas o ideal é que sua indicação seja avaliada por um médico caso a caso.

Uma vacina brasileira

Por que nao tem vacina para dengue

Fig 4. Vírus da dengue vistos em um microscópio eletrônico. Cada estrutura circular é um vírus. Cores-fantasia. Aumento desconhecido. Crédito: Safoni Pasteur/Institut Pasteur/Flickr.

Há várias pesquisas sobre vacina contra a dengue. O Instituto Butantan, em parceria com outras instituições, como o Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos Estados Unidos (NIAID, em inglês), conduz uma dessas pesquisas há mais de dez anos. Chamada provisoriamente de Butantan-DV, essa vacina tem se mostrado eficaz contra os quatros tipos de vírus da dengue. Ela é feita de vírus atenuados, ou seja, enfraquecidos e incapazes de provocar a doença.

No momento, a Butantan-DV está na fase 3, a fase final de desenvolvimento. Nesta etapa, cerca de 17 mil voluntários, entre 2 e 59 anos de idade, recebem a vacina. As pessoas que recebem a vacina são acompanhadas para verificar a segurança e a eficácia do imunizante. Os resultados, até agora, são promissores: estudos divulgados em março de 2022 mostraram que a Butantan-DV induziu a produção de anticorpos em 100% das pessoas que já tiveram dengue e em mais de 90% das que nunca tiveram.

A fase 3 da pesquisa deve terminar em 2024, mas ainda não há data para a Butantan-DV estar disponível para a população. Mesmo assim, essa é uma excelente notícia para o país porque a vacina deve reduzir muito a quantidade de casos de dengue, sobretudo os casos graves, que requerem internação e podem levar à morte.

A vacina é sem dúvida um grande avanço, mas não podemos relaxar no combate ao mosquito Aedes aegypti. Dez minutos por semana fazem muita diferença! Saiba como e participe da campanha 10 Minutos contra a Dengue, do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz).

Fontes consultadas:

Wilder-Smith A. Dengue vaccine development by the year 2020: challenges and prospects. Curr Opin Virol. 2020 Aug; 43: 71–78. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7568693/ Acessado em 9 de maio de 2022.

Instituto René Rachou/Fiocruz Minas. Dengue. http://www.cpqrr.fiocruz.br/pg/dengue/ Acessado em 9 de maio de 2022.

CDC. About Dengue: What You Need to Know. https://www.cdc.gov/dengue/about/index.html. Acessado em 9 de maio de 2022.

Instituto Butantan. Vacina da dengue tem imunogenicidade superior a 90%, mostra ensaio clínico; Butantan deve finalizar fase 3 até 2024. https://butantan.gov.br/noticias/vacina-da-dengue-tem-imunogenicidade-superior-a-90-mostra-ensaio-clinico–butantan-deve-finalizar-fase-3-ate-2024. Acessado em 9 de maio de 2022.

Por Tereza Costa

Data Publicação: 09/05/2022

    Tags Relacionadas:

  • aedes aegypti
  • dengue
  • vacina